Friday, June 01, 2007

487

487 era o número da minha senha na fila para renovar o passaporte, na sede da Polícia Federal no bairro da Lapa. Cheguei antes das 7h da manhã e só saí de lá às 15h30. 113 pessoas ainda saíram depois de mim, já que foram 600 senhas distribuídas no dia. O primeiro da fila havia chegado às 22h30 do dia anterior. O segundo, à meia-noite. Houve gente que levou banquinho para descansar o peso da burocracia. Houve gente que levou cobertor para suportar o frio da madrugada. Eu levei muita paciência e um dia de folga no trabalho.

Interessante reparar nos tipos que circulavam por ali: de religiosos com prováveis missões no exterior a travestis com passagem marcada para Milano, Zurique ou Paris.

Enquanto aguardava minha vez, já imaginava a cara que eu ia fazer para tirar a foto do passaporte, simulando um mínimo de simpatia depois de horas mofando numa fila tediosa, em um prédio hediondo de tão feio. Sério, apesar dos milhões superfaturados que aquele bloco de concreto cafona deve ter custado, era uma das construções mais feias que eu já vi. Destaque para uma escada helicoidal ligando os três pavimentos, que de tão medonha deveria ser banida pela Operação Cidade Limpa.

Mas voltando à cara de foto, notei que não era só minha essa preocupação. Vi uma mulher de peruca (e pode?) e outra com a sobrancelha desenhada com delineador (e pode?). A mulher atrás de mim na fila, uma senhora mulata muito simpática, falava ao celular sobre a escova que fizera no dia anterior para sair bem na foto. Kkkkk! A adolescente oriental à minha frente levou estojo de maquiagem. Eu, não adepto de escova, peruca e muito menos de maquiagem, estava em maus lençóis.

Pode escrever aí: os passaportes tirados em São Paulo este ano serão uma coleção de Glória Perez' Eyes nunca antes vista. Fruto de uma noite mal dormida e horas de fila. Muito medo.

Na hora da foto, a policial que me atendeu me perguntou se eu era militar, pois, segundo ela, eu tinha cara de ser do Exército. A idéia me pareceu absurda e isso me fez rir, já que o certificado de dispensa da corporação é um dos documentos exigidos e estava na mão dela. O resquício de riso na foto ficou simpático, e até me pareceu que não saí tão mal assim. Mas pode ser que eu tenha me acostumado à feiúra do prédio e, na comparação, meu rosto cheio de olheiras levou vantagem.